Prendeu a fiação na turbina improvisada, um toque na alavanca do pequeno guindaste fez a peça deslizar suavemente para dentro do rio. Um zunido baixo ressoou quando a força da água começou a fazer girar as palhetas. As luzes de potência foram acendendo uma a uma, os ponteiros dos indicadores do painel oscilaram até se fixar na zona verde. Era energia suficiente.

Olhou ao redor. Céu azul. O canto dos pássaros e o cacarejar das galinhas no terreiro eram os únicos sons. Não havia viva alma a pelo menos uma légua dali. Arrastou os cabos grossos pela grama alta e verdejante por uns vinte metros até a velha cabana. Empurrou-os janela adentro, deu a volta e entrou pela porta da frente. Cruzou a sala minúscula e desabitada de móveis desviando de um gato, que perseguia alguma coisa pelos cantos das paredes.

Chegou ao quarto dos fundos, tinha montado tudo lá. Semanas empilhando equipamentos, fazendo conexões, soldando, testando. O maquinário quase tocava o teto, e centenas de metros de fios de todas as cores e espessuras tornavam quase impossível transitar pelo cômodo.

Puxou os cabos que despontavam na janela e os levou até os seus devidos conectores, o suor dificultava segurar qualquer coisa com firmeza. Fazia um inferno à sombra lá fora, mas com todo aquele metal, luzes, eletricidade circulando e quase nenhuma ventilação as coisas não estavam melhores do lado de dentro.

Descalçou as botas, tirou a camisa e usou para enxugar o rosto e as mãos. Considerando os níveis de energia com os quais estava lidando, preocupar-se com segurança não fazia sentido, pois, mesmo no menor dos problemas, qualquer um dos fios tinha voltagem suficiente para matar um elefante. Esse pensamento lhe trouxe à lembrança o pobre animal eletrocutado por Thomas Edison, em sua campanha de difamação contra a corrente alternada de Tesla.

Assim como Tesla, ele também conhecia o dissabor de ser vilipendiado, ser chamado de embuste, de ter seu trabalho relegado à pseudociência. Enquanto fazia o ajuste fino dos aparelhos, conferia conexões, realizava medições e checagens, ocupava a mente imaginando o impacto do resultado daquela experiência. A corrente alternada tinha mudado a face do planeta, mas a ciclo reversão seria ainda maior.

Pegou a filmadora, arrumou o tripé e apontou para a cadeira metálica no centro do cômodo. Apanhou em um dos cantos uma caixa de madeira entalhada. Abriu. Dentro, sobre um fundo de veludo azul, um revólver prateado e seis balas. Carregou o tambor da arma com uma bala apenas, girou-o posicionado orifício com a munição na posição do tiro subsequente e depositou-a sobre uma mesinha próxima.

Arrumou-se na cadeira, fixou todos os eletrodos no peito, na cabeça e na sola dos pés. Só teria uma chance, precisava acertar de primeira. Travou as cintas nos tornozelos e no peito, estava totalmente atado à cadeira a não ser pelas mãos. Testou o cronômetro de fechamento automático da algema do pulso direito, e o comando de voz para destravá-la. Ambos funcionaram a contento.

“É agora ou nunca! Rumo ao Nobel!”. Travou a algema do pulso esquerdo, pegou com a mão direita a arma ao lado da cadeira, encostou abaixo do queixo e puxou o gatilho. O topo do crânio explodiu, e uma pequena chuva de sangue e miolos espalhou-se sobre o equipamento ao redor. A mão caiu desfalecida sobre o braço da cadeira e a algema travou automaticamente, prendendo-a.

Antes mesmo do eco do disparo terminar de ressoar nas velhas paredes, o grande forcado em forma de U, pendendo sobre a cadeira, começou a girar. Um barulho agudo cada vez mais alto tomou conta do quarto, e centenas de faíscas azuis inundaram o ar. Um espasmo do corpo fez a cadeira tremer. Um segundo espasmo se seguiu, maior e mais forte. E o homem passou a se debater com violência cada vez maior até uma parada súbita.

A máquina diminuiu seu ritmo até cessar. Depois de alguns segundos houve um gemido fraco. O homem começou a se mover. Dedos, mãos, braços. Ergueu o queixo e olhou para a câmera com um sorriso meio idiota. Deu o comando de voz para abrir a algema do pulso direito, depois destravou o resto das medidas de restrição. Levou a mão instintivamente à cabeça.

Correu até uma caixa no chão e começou a tirar as coisas de dentro, jogando-as de qualquer jeito, até achar um espelho. Escrutinou o próprio rosto e depois, com alguma dificuldade, o topo do crânio. Não havia qualquer marca, nem onde bala entrara, nem onde saíra. A experiência fora um sucesso completo. Começou a rir alto e saltitar como uma criança. Correu para fora com tanta avidez que nem sequer percebeu o pequeno monte de pó preto no canto da sala vazia.

No primeiro passo do lado de fora, o sorriso desvaneceu. O impacto inicial foi o contraste. O preto do pó cobrindo a terra contrastava com o mesmo céu azul visto a pouco. A grama tinha sumido, e a linha das árvores havia recuado pelo menos duzentos metros. Pegou uma pitada de pó do chão, não tinha cheiro. Voltou a fitar o horizonte, e só então percebeu o total silêncio. Os pássaros, as galinhas, até os mosquitos tinham sumido.

Caminhou pelo campo estéril por vários minutos antes de encontrar qualquer coisa além de pedras. Quando achou, havia uma divisão clara, uma grande linha separando o chão negro da frágil rama de erva daninha à sua frente. Estava a quase um quilômetro da cabana. Resolveu seguir a linha. A fronteira seguia numa curva perfeita, mesmo através do rio era possível ver como a vegetação do leito e da margem tinha sido afetada.

A curva se fechava num círculo de quase dois quilômetros de raio, cujo centro era a velha cabana. E dentro desse círculo o homem era a única coisa viva, todo o resto havia evaporado, deixando para trás aquele monte de cinzas cujo vento já começava a varrer. Ao perceber o preço do seu sucesso, sorriu.

— O importante é ter funcionado.