O homem que roubava títulos
Eu sempre odiei texto sobre o ato de escrever. Metalinguística é um negócio complicado e precisa de muito talento para não ficar uma merda. Mas hoje eu vou de “querido diário” nessa linha, porque estou com vontade de escrever e essa vontade é rara, não se pode desperdiçar. Escrever é como sexo, texto mais ou menos é melhor que texto nenhum.
Tirei o dia para olhar o Medium. Sim, aqui, onde estamos1, onde você está lendo isso (eu acho, talvez). Faço isso a intervalos irregulares de alguns dias a alguns anos. Sigo várias pessoas, mas não leio tudo que elas postam, vou recuperando conteúdo nesses dias equinociais em que estou para ler.
Tem muita gente boa no Medium. Só dou a uma pessoa um título e um parágrafo para me convencer e, ainda assim, um monte de gente me convence. Também notei que mulheres chamadas “Helena” costumam dar bons resultados. O motivo eu não sei, mas alguma razão o Manoel Carlos tinha.
Ler gente aqui me decepciona de dois jeitos: Por um lado, tenho que minerar. Sou chatíssimo e na internet tem muita porcaria. Por outro, há textos de uma genialidade absurda que esmagam qualquer resquício de amor próprio que eu poderia ter pela minha própria escrita. Um puxadinho de decepção que vale a pena citar é: Todo mundo parece ser formado/pós formado/especializado/viajado/vivido/publicado/reconhecido/multicultural e vários etcs.
Acho que, se descobrirem que eu escrevo aqui, vão me expulsar junto com a minha formação de dois anos em tecnologia e o meu inglês de quinta, hahaha. Essa sensação pelo menos me deu uma ideia de título para o meu próximo texto: “Eu não sou qualificado para isso”.
Aliás, tenho muito o que agradecer a quem publica por aqui, até mesmo aos autores dos textos ruins. Vocês me suprem de uma coisa maravilhosa que me ajuda muito, tanto com a faísca inicial para botar alguma coisa no papel, quanto a adicionar a cerejinha falsa de mamão com corante vermelho sobre textos já prontos. O Medium é uma fonte quase infinita de títulos.
Sim, eu roubo títulos, e faço sem preconceito nenhum de idioma, autor, ou qualidade do conteúdo atrelado. Mesmo os textos mais rasteiros podem ser precedidos de títulos espetaculares que renderiam, eles próprios, uma boa história. Eu tenho um listinha no Keep com os melhores.
Pode parecer besteira, mas eu sou um “““escritor””” movido a nomes próprios. Para mim, um título, ou um nome de personagem, é um pedaço condensado de ideia. Eu comungo daquele velho clichê de entrevista que afirma que os personagens tem vontade própria. Claro que não tem. Mas todo personagem é uma lente, um jeito específico de focalizar a minha própria personalidade. Essa lente é forjada, em grande parte, a partir do nome certo. Com textos, e com títulos, é a mesma coisa.
No caso desse texto, no melhor estilo inception, a motivação veio de encontrar um título maravilhoso que, surpresa, estava conectado a um texto igualmente maravilhoso. Não posso roubar o texto. Para minha infelicidade, ser escritor envolve, obrigatoriamente, escrever. Mas para títulos não existe copyright, regras morais ou acordo de monogamia.
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Esse texto foi originalmente postado no Medium. ↩